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Sobre Formas em SP

Crítica escrita por Valmir Santos, publicada originalmente no Jornal Latino-Americano que circulou durante a VI Mostra Latino-Americana de Teatro de Grupo, sobre a apresentação de Formas de Brincar em 27/04/11 na passarela do Metrô Vergueiro em São Paulo.

Mostra Latino-Americana de Teatro – Formas de brincar
Por Valmir Santos – TeatroJornal – leituras da cena

O ERRO Grupo parte com tudo para cima do tema do desejo mercantil sobre a mulher. Suas três atrizes engolem o espectador masculino ou congênere com closes cavalares de olhos e bocas pintados pela imagem do gozo a qualquer custo. A persuasão está na berlinda. Alguém ainda tem dúvida por que a indústria da cerveja força a barra com corpos esculturais? Sobrou até para as devassas. A máquina da voracidade com que essa carne é historicamente barateada ganha um conteúdo contundente em Formas de brincar.

Já que as campanhas publicitárias, quem diria, soam cada vez menos subliminares, vão direto ao ponto, a intervenção delicia-se nas entrelinhas do território lúdico do sexo, aquele sobre o qual a atenção pública cai de joelhos sem pestanejar. É como se a obra jogasse com a mesma moeda – e assumisse seus riscos. Sarah Ferreira, Luana Raiter e Paula Felitto posam de beldades, tipos que se insinuam montadas em tamancos, molejos e malícias outras. Não demora, surgem uma a uma com novas roupagens da estereotipia feminina: a dançarina, a gueixa e a tradicionalista. Até arrancarem todas as fantasias e se despirem em pele de corpetes que as revelam joguetes entregues às carcaças de si.

A metamorfose cênica se dá pela relação com os transeuntes que ora se aglomeram ora refluem. Já o cordão de aço que suspende as partes de esqueleto animal no plano aéreo é mal posicionado e pouco perceptível à maioria. Diferente do diálogo performativo de Juarez Nunes e Michel Marques, donos de uma concentração sutil que os põe em paralelo à narrativa, desde uma mesa de canto, lançando suas apostas para qual delas teve melhor desempenho.

O roteiro de Luana Raiter e Pedro Bennaton desenvolve musculatura para instaurar ruídos quanto à exploração da cidadania e da condição humana. Os enunciados não correspondem às imagens geradas; e a crítica mora no que contradiz. A encenação de Bennaton coordena as ações com rédea solta, digamos, legitimando o potencial das atrizes para o improviso sobre a lascívia da qual nunca se sabe o desfecho diante do estranho levado pela fé da intimidade, ou vice-versa, o sujeito que cede a lente de seus óculos escuros espelhados para a moça passar batom nos lábios carnudos. O trabalho caminha por esse fio de arame entre deixar-se trair pelo relaxamento a que induz ou produzir o paradoxo pelo que satura. É essa tensão que mantém o interesse do percurso e seus desvios.

(Publicado originalmente no jornal latino-americano, que circula durante a Mostra)